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OPINIÃO: Die Gedanke sind frei

Como escapei, vivinho da silva, de duas inesperadas cirurgias - tal e qual mencionei em um dos meus artigos anteriores, "Só sei que nada sei" -, tenho a dizer algo mais agora, me permitam.

Começo lembrando que, como afirma uma canção alemã do começo do século XIX, Die Gedanke sind frei (os pensamentos são livres). Cicero já o dissera: "Liberae sunt nostrae cogitationes".

Trechos dessa canção dizem tudo: "Meu anseio e desejo ninguém pode negar e assim sempre será: os pensamentos são livres. Se eu for jogado na masmorra mais escura isso seria um trabalho inútil, porque meus pensamentos quebram todas as portas e paredes, os pensamentos são livres!"

Escrevi há alguns anos um livro - por que tenho medo dos juízes - traduzido para o francês em 2014 (Pourquoi j'ai peur des juges), no qual afirmo que as coisas resultam terrivelmente perigosas quando juristas, juízes e tribunais à nossa volta danam-se a decidir a partir de valores, afastando-se do direito positivo. Relembro, recorrentemente, a observação de Franz Neumann: "um sistema legal que construa os elementos básicos de suas normas com princípios gerais ou padrões jurídicos de conduta não é senão um disfarce que oculta medidas individuais".

Mais, que o modo de pensar criticamente que me conduz convence-me de que o modo de ser dos juristas, juízes e tribunais de hoje - endeusando princípios, a ponto de justificar, em nome da Justiça, uma quase discricionariedade judicial - compõe-se entre os mais bem acabados mecanismos de legitimação do modo de produção social capitalista. Decidir em função de princípios é mais justo, encanta, fascina e legitima o modo de produção social. Aquela coisa weberiana da certeza e segurança jurídicas sofre, então, atenuações. Evidentemente, no entanto, única e exclusivamente até o ponto em que não venha a comprometer o sistema!

O fato de meu livro ter sido traduzido ao francês me encantou, mas agora entrei em delírio! Delírio que justifica esta expansão de escrever este texto para o nosso Diário de Santa Maria - no qual tento produzir literatura, singelamente - contando a quem tem paciência de me ler que o traduziram para o alemão e publicaram pela Nomos Verlag. Alteraram seu título para Das Verhältnis der Richterschaft zum Recht, o que me surpreendeu, mas sou capaz de compreender.

A relação do judiciário com a lei, seu novo nome de batismo em português, há de interessar mais ao seu leitor potencial, eventual comprador de algum volume (rezo para que seja mais de um!), do que a afirmação de que tenho medo dos juízes...

O que mais importa, contudo, é que agora - além de gritar minha alegria - certamente quem o ler lá na Alemanha dirá que é verdade, Die Gedanke sind frei.


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